Movimento prega o fim do cristianismo confortável.
Pastores pedem que cristãos voltem a ser "radicais" |
O
palco da Igreja em Brook Hills, no Alabama, parecia um depósito de
lixo.
Seu pastor, David Platt, decidiu convidar os membros a trazerem
para o templo pedaços de metal, de madeira, lonas, e outros “detritos”
que tinham em casa.
O objetivo era mostrar como vivem os pobres na
Índia.
Afinal, a igreja havia decidido se lançar em uma campanha
de intercessão por aquela nação marcada por questões sociais graves e
pelo politeísmo.
O lixo era apenas uma ferramenta para estimular os
fieis a contribuírem financeiramente para cuidar de crianças pobres
através de programas sociais da missão cristã Compassion International.
Isso
tudo aconteceu em 2010 e a iniciativa rendeu 525.000 dólares para
projetos sociais na Índia e despertou os membros a orarem durante um ano
inteiro pela Índia.
Sua igreja é filiada à Convenção Batista do Sul,
uma das mais tradicionais do país.
Platt é um dos pastores considerados
“chave” no movimento “radical” que parece ter tomado a igreja nos EUA
nos últimos anos.
Não por coincidência, Platt lançou seu livro
“Radical:
Separando sua fé do sonho americano” em maio de 2010 e a obra
passou mais de dois anos na lista dos mais vendidos do The New York
Times na categoria literatura cristã.
O jovem pastor de 34 anos é
conhecido pela ousadia de suas mensagens e pela convicção com que as
prega.
“Estou convencido de que muitas pessoas em nossas igrejas
estão simplesmente perdendo o sentido da vida cristã e que muito disso
tem a ver com o que nós lhes vendemos como o Evangelho.
Ou seja, esta
oração, “aceite Jesus em seu coração, convide Cristo em sua vida está
construída sobre areia movediça e corre o risco de desiludir milhões de
almas”, disse ele em um vídeo muito comentado na internet ano passado.
A principal mensagem de Platt é que os cristãos do século 21 esqueceram o “Jesus radical” da Bíblia
e decidiram ficar com um evangelho marcado por “individualismo,
materialismo e universalismo” que “nos cegou para a pobreza mundial
generalizada e o grande número de pessoas que nunca ouviu falar de
Jesus, enquanto nos preocupamos apenas com nós mesmos e com o que
podemos ganhar dos céus”.
Mas ele não é o único a tentar recuperar
uma compreensão mais rigorosa das exigências do Evangelho.
Seis anos
atrás, Shane Claiborne foi chamado de criador do movimento de “radicais
comuns” quando lançou seu livro “A Revolução Irresistível”, onde faz uma
crítica semelhante e apresenta uma proposta pacifista e de teor
ecologico.
Recentemente, Kyle Idleman, pastor da Southeast
Christian Church, em Louisville, Kentucky, escreveu “Not a fan” depois
de perceber que estava pregando um Jesus “tão atraente, confortável e
conveniente quanto possível.
” Francis Chan pegou a onda com “Louco
Amor” , um livro onde afirma que necessitamos “mais de Deus”, mesmo que
estejamos “cercado por pessoas que acreditam ter o suficiente de Deus”.
Steven
Furtick, cuja Igreja Elevation, na Carolina do Norte, é um das
megaigrejas que mais crescem nos EUA, acrescentou sua obra “Greater”
[Maior], onde explica que os cristãos estão atolados na mediocridade e
deveriam abrir a “imaginação para a possibilidade de que Deus tem uma
visão para a [nossa] vida muito maior que o que possuímos”.
Todos estes
têm vendido milhares de cópias de seus livros.
O sucesso de
mercado dessa mensagem radical indica que existem pessoas ansiosas em
ouvi-la.
Sendo os EUA o maior produtor de literatura evangélica do
mundo, não é difícil esperar que em breve esses e outros livros atinjam
cristãos de boa parte do mundo que estejam insatisfeitos com a igreja
atual.
Para os especialistas, trata-se de uma resposta aos
pregadores da “teologia da prosperidade” e do liberalismo exagerado da
“igreja emergente”.
Esses pensadores não são teóricos, são pastores que
conduzem igrejas, que desejam muito ver uma “fé radical em um Jesus
radical”, como afirma Platt.
Não se trata de uma mudança de
paradigma teológico nem uma nova doutrina, mas é um resgate de um
cristianismo mais parecido com as suas origens, onde ser um seguidor de
Jesus era algo “inconveniente, desconfortável e custoso” e a fé não era
um fim em si mesma, mas um meio de se entender quem é Deus e o que Ele
quer.
Esse movimento também tem apontado para uma “nova santidade”
ou uma percepção nova de um antigo desafio, de ver conversão como uma
mudança real de vida.
Por enquanto, os novos radicais parecem ser, em
sua maioria, jovens solteiros, que frequentam a faculdade e se preocupam
com os pobres e com o planeta, além de pensar muito em seu próprio
futuro.
O fato de uma revista importante como a Christianity Today
ter colocado o assunto como sua matéria de capa e principal matéria na
edição deste mês é um indicio que a questão está chamando atenção de um
público maior.
Além disso, a mensagem radical gera cobranças sobre
aqueles que a vem apregoando.
Por exemplo, o pastor Platt anunciou que
doaria todo o lucro obtido com seus livros para projetos missionários
fora de sua igreja.
O tempo mostrará se David Platt, Francis Chan, Shane
Claiborne e Kyle Idleman vieram para ficar, mas é agradável saber que
por trás de toda essa formulação existem ecos de figuras importante como
Soren Kierkegaard, que protestou contra o cristianismo
institucionalizado ou Dietrich Bonhoeffer, que lamentou a popularização
da “graça barata”.
Por enquanto, a cada culto ainda sentam nos
bancos milhares de cristãos que ignoram (ou se esquecem) do chamado para
o sacerdócio universal dos membros da igreja e os desafios lançados por
Jesus para cuidarmos dos pobres, influenciarmos positivamente o mundo à
nossa volta e não vivermos para nós mesmos.
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